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Miguel  Viegas

Intervenção de Miguel Viegas na Assembleia Municipal Extraordinária de 18 de Março de 2010 (1ª reunião).
Índice:
» 1 - Pedido de emissão de Declaração de Interesse Público
» 2 - Orçamento e opções do plano 2010

Nesta Assembleia, o PCP votou favoravelmente os dois primeiros pontos em discussão. O primeiro destinado a viabilizar a ampliação da fábrica TAMFELT (ex-Fanafel) recebeu o voto favorável do PCP tendo em conta as garantias dadas sobre o impacto do projecto ao nível dos territórios circunvizinhos e igualmente ao nível da ribeira da Sra. da Graça, mas também a criação de novos postos de trabalho e salvaguarda dos existentes.

 

No segundo ponto discutiu-se o Orçamento e as Grandes Opções do Plano para 2010. Considerando um esforço, ainda que ténuo, da Câmara em aproximar o orçamento da realidade das contas, considerando como válidas um conjunto de opções do plano que correspondem do ponto de visto do PCP a necessidades objectivas da população do concelho, designadamente em matérias de modernização do parque escolar, considerando ainda a opção gestionária que representa o acolhimento de uma proposta do PCP que irá melhorar as remunerações do pessoal afecto à Câmara que tem vindo a sofrer ao longo dos últimos anos significativas perdas de poder de compra por culpa das políticas governamentais, o PCP entendeu votar favoravelmente este orçamento dando assim a esta Câmara um sinal de confiança que será devidamente avaliado ao longo da sua execução.

Pedido de emissão de Declaração de Interesse Público

Trata-se de uma aprovação contra-natura ao arrepio de todas as regras de bom senso em termos de planeamento urbano. Temos uma zona industrial que se encontra claramente subaproveitada e portanto fica-me a dúvida se foram esgotadas todas as soluções alternativas. Naturalmente que estas questões não são simples, mas como é dito e bem pelos serviços da Câmara, estamos a falar de um território que está em pleno espaço urbano, enclausurado entre a linha de caminho de ferro e o curso da Ribeira da Sra. da Graça, com acessos limitados e, portanto, onde haveria toda a vantagem em deslocalizar a empresa para a Zona Industrial onde iria encontrar todas as condições ideais para laborar.

Contudo, não podemos ficar indiferentes ao momento que se vive. Temos também a noção das dificuldades da economia e da necessidade desta Câmara não travar nenhum processo de desenvolvimento industrial numa altura onde a criação de emprego no curto prazo é absolutamente decisiva.

Neste sentido, e na medida em que estamos a aprovar uma declaração de interesse público municipal, creio que se impõem algumas questões que gostaríamos de ver respondidas. Em primeiro lugar, seria interessante saber quais os fundamentos desta ampliação e em que medida esta irá contribuir para uma eventual criação de postos de trabalho. Em segundo lugar, face à proximidade da linha de água, e considerando as reservas colocadas pelos serviços da Câmara acima citadas, gostaria de saber se já existe pelo menos uma ideia da implantação dos edifícios a construir e respectivos acessos. Finalmente seria igualmente importante saber que tipo e para que fins de destinam as construções que estão na base desta ampliação, para que se avalie do seu impacto ambiental, nomeadamente ao nível sonoro.

Creio que são pertinentes estas questões, porque existe aqui claramente o risco de se generalizar o uso desta figura de interesse público. A darmos aqui o aval sem saber exactamente quais as contrapartidas, que legitimidade terá esta Câmara para avaliar toda e qualquer pedido futuro com base apenas numa vaga ideia de manutenção dos postos de trabalho? As questões de planeamento são porventura das mais difíceis competências municipais. E é normalmente por aí que as Câmara tendem a ceder. Veja-se os múltiplos atentados que forma sendo cometidos na nossa costa ao longo das últimas décadas. Veja-se o Furadouro que cresceu não em cunha como recomendam todos os especialistas, mas precisamente ao contrário, com enormes prédios mesmo na orla marítima. E portanto ao darmos aqui mais uma “facada” nas normas de planeamento que deveriam ser sagradas, quero pelo menos ficar tranquilo relativamente a eventuais contrapartidas para Ovar e para as populações.

Ainda a propósito desta questão, aproveito para sublinhar o enorme valor ambiental e patrimonial da Ribeira da Sra. da Graça que fica ameaçada e relativamente à qual espero que sejam tomadas todas as medidas destinadas à sua preservação. Todo o seu curso, e com especial relevo na zona da Fonte da Madria, a montante até à N109 e a jusante até ao Mercado, poderia representar um autêntico corredor ecológico de grande beleza, caso não estivesse completamente ao abandono. Lembro também que deste curso saem um conjunto de canais que alimentam um conjunto de moinhos de água mesmo a montante da Fonte das Luzes. O PCP já propôs por diversas vezes a inventariação e recuperação destes moinhos de grande valor e que estão retratados num dos painéis de azulejos na Estação de Ovar (ver aqui e aqui). Finalmente e mesmo adjacentes a estes moinhos se encontra a Quinta do Dr. Silveira, personagem ilustre da histária desta cidade, médico do povo que inspirou Júlio Dinis na criação da personagem do Dr. João Semana. Não ficaria mal à Câmara, nas negociações com a empresa, negociar pelo menos o arranjo das margens da Ribeira entre a N109 e a linha de caminho de ferro. Está lançado o repto. Vamos ver se a Câmara tem firmeza negocial.

Miguel  Viegas

Orçamento e opções do Plano 2010

Verifico neste orçamento algum ajustamento visando aproximá-lo da realidade. Contudo trata-se de uma tentativa ainda tímida pelo que mais uma vez vamos aqui aprovar um orçamento mais ou menos fictício que não corresponde ao que irá ser o exercício financeiro desta Câmara em 2010.

Em traços muitos gerais continuamos a ter uma previsão absolutamente irrealista na venda de bens de investimento no valor de 10 milhões de euros, quando sabemos que as taxas de execução são da ordem dos 0(zero)%. Pelo menos era essa a taxa no relatório de Outubro. Por outro lado temos outros 10 milhões de euros nas transferências de capital que depois apenas são cumpridas em cerca de 30%, tal como o foi em 2009. Temos portanto uma verba fantasma que ronda os 15 a 17 milhões de euros que não existe, e que depois corresponde mais ou menos há diferença entre um orçamento de cerca de 50-52 milhões de euros que depois desemboca numa exercução na ordem dos 35-37 milhões de euros.

Não estou a dizer que esta é uma prática ilegal, estou apenas a dizer que a mesma não abona nada em nome do rigor das contas. No fundo, elencam uma série de obras, muitas das quais a Câmara sabe de antemão que não irão ser cumpridas, soma os custos, e como as receitas reais não chegam, acaba por empolar aquelas duas rubricas por forma a apresentar um orçamento equilibrado como a lei exige.

Fez realmente um esforço, não o nego mas poderia ir-se mais longe, como uma lista mais criteriosa das obras a contemplar. Verifico um ajustamento dos impostos indirectos tendo em conta a execução de 2009 que ficou muito aquém do previsto. Está correcto. Só não entendo a verba prevista na cobrança de impostos que não existem (Sisa, contribuição autárquica etc.). Não sei se resulta de dívida a cobrar. O certo é que nada se cobrou relativamente a estas rubricas em 2009. Também tenho dúvidas relativamente aos impostos directos cuja previsão foi revista em alta para 2010, apesar de em 2009 esta receita ter ficado abaixo do previsto.

Como já tive ocasião de provar na comissão especializada, esta forma de construir orçamentos não é uma fatalidade. Existem dezenas de concelhos com taxas de execução global acima dos 85% como é possível verificar no anuário autárquico de 2007, obra com o patrocínio da Câmara Oficial dos Técnicos de Contas e do Tribunal de Contas. Repare-se que mesmo na receitas correntes, porventura aquelas que são de mais fácil previsão, a taxa de execução desta Câmara é de apenas 80%. Ora este é uma valor que considero razoável mas para toda a execução global do orçamento que anda à volta dos 60% no nosso caso. Quero portanto querer que este pequeno ajustamento vai, embora de forma tímida na boa direcção. Porque senão, escrever no orçamento que as despesas correntes representam 60% do orçamento global quando sabemos que no final as mesmas irão representar perto de 80% não abona nada em nome do rigor e da transparência.

Quanto à parte politica do orçamento, começo por alguns reparos pontuais e termino com uma crítica global. Em primeiro lugar é dito e sublinhado que se trata de um orçamento participativo. Não vamos brincar com as palavras. O orçamento participativo é hoje uma prática claramente definida, descrita em centenas de autarquias por todo o mundo. Encontra-se inclusivamente enquadrado no programa da União Europeia Equal visando a coesão social e financiado pelo FSE. Este não é portanto um Orçamento Participativo. Já descrevi na última Assembleia algumas das características que devem reger a existência de um OE. Registo o interesse desta Assembleia e desta Câmara. Proponho inclusivamente que a Comissão Especializada de Finanças seja promotora desta iniciativa, visando designadamente:


Quanto às opções do Plano, verifico algumas penosas lacunas:

 

Finalmente e no capítulo dos reparos pontuais, verifico na opções do plano a ligação entre a Zona escolar e a zona desportiva com 5 mil euros. Não sei se são os cinco mil euros que são alocadas a todas as outras ruas a título meramente simbólico ou se existe mesmo vontade de melhorar aquela via com passeios, porque esta é de facto uma necessidade tendo em conta o fluxo crescente de utentes.

Concluo com uma crítica de fundo a este orçamento. Uma critica que tem a ver com o facto deste orçamento, nos seus termos e nas suas propostas, ser um orçamento fora do tempo, fora da realidade social e económica que estamos a viver. Ovar vive num período de enorme dificuldade que resulta de uma crise económica e social que afecta todo o pais e o mundo que cujo fim não está ainda à vista. No seu preâmbulo não se vê uma referencia a esta crise e muito menos medidas que possam contribuir para minorar os seus efeitos. Sabemos que as competências municipais são reduzidas neste contexto. Mas existem contudo vários aspectos que poderiam e deveriam ser considerados, num quadro natural de contenção de despesa e equilíbrio financeiro.

A primeira tem a ver com a nossa zona industrial cuja estado e degradante. As opções contemplam o arranjo de arruamentos mas parece-me pouco. É urgente e requalificação completa de toda a zona, com arranjo dos pavimentos, dos passeios e da iluminação. São necessários alguns espaços verdes para o seu embelezamento. Era fundamental articular com o governo e com o ministério na economia a possibilidade de ligação da linha férrea à zona industrial com criação de uma placa logística que potencia o transporte ferroviário e as suas ligações aos portos de Aveiro e Leixões. Impunha-se uma verdadeira estratégia de promoção da zona industrial tirando partido da sua localização privilegiada e dos seus acessos aos grandes eixos rodoviários e ferroviários. Onde está a zona industrial quando abrimos o site da Câmara. Então a Câmara não está interessada em vender lotes para aumentar as receitas de capital. Ora aí está uma forma de aliar o útil ao agradável.

Já propus por diversas vezes a criação de uma Agência Local de Desenvolvimento. Trata-se de um instrumento que existe em múltiplos concelhos e que pretende reunir todas as forças económicas do concelho, industriais, comerciantes, produtores agrícolas, sindicatos onde são pensadas estratégias de desenvolvimento. Destas agências nascem projectos de investimento e candidaturas a financiamentos europeus que podem contribuir e muito para o crescimento económico do concelho. Olhando para os exemplos que existem às dezenas em Portugal, verificamos a existência de actividades muito diversificadas em função das realidades locais. Estas actividades podem ir desde a formação profissional, aconselhamento jurídico, captação de fundos comunitários, promoção de produtos tradicionais, divulgação de produtos turísticos etc. É um contributo, e creio que vale a pena pensar nele.

Disse.