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Sempre me impressionei com as estórias de vida, que, homens de trabalho alentejanos, (muitos analfabetos), trazem a público sob a forma de poesia popular.Como experimentar não ofende,aventurei-me a escrever umas décimas [não da inflação] como forma de homenagear os meninos,camaradas da minha infância,que com fome,suor e lágrimas,comeram o pão que o barro amassou!

 

M o t e

O trabalho tem razão
Pois engorda o Capital
Com tanta exploração
O capital vive bem,o trabalho vive mal!

Desde pequeno me lembro
Crianças a trabalhar
Sem dinheiro para estudar,
As mães a lavar no rio
E os miúdos ao frio
Iam o barro amassar,
Pr’a noite poder cear
Parca mesa e pouca féria
Com salários de miséria,
O trabalho tem razão.

O tempo passa depressa
E a vida sempre a mesma
Tratados como uma lesma
O corpo foi-se mudando,
Uns copos de vez em quando
Cigarro p’ra parecer homem
Como os olhos também comem
Um filme de vez em quando,
Com lágrimas foi-se passando
Pois engorda o Capital.






Em tempo de vacas magras
Com guerra por todo o lado
O medo de ser soldado
Estava sempre presente,
Na mente de toda a gente
Uns emigravam a salto
Outros sempre em sobressalto
Não podiam dizer não,
Tudo era a bem da nação,
Com tanta exploração.

Enfim o Abril chegou
E lá veio a boa nova,
Começou a grande prova
E o povo viveu melhor
Mesmo não sendo doutor,
A esperança fez-se na luta
E a flor deu em fruta;
Reacção quis o regresso
E travou o progresso
O capital vive bem,o trabalho vive mal!