Conforme anunciado, a Comissão Concelhia de Ovar do PCP organizou na passada sexta-feira uma sessão pública visando esclarecer a população sobre a adesão da Câmara Municipal de Ovar ao sistema multimunicipal encabeçado pela empresa Águas da Região de Aveiro. Participaram neste debate Jorge Fael, vice-presidente da Associação Água Pública e Miguel Viegas, eleito do PCP na Assembleia Municipal de Ovar.
Perante uma plateia atenta, Jorge Fael, aproveitando o seu enorme capital de experiência neste domínio, defendeu a manutenção dos sistemas de distribuição de água e saneamento nas mãos das autarquias locais como a única garantia de existência de um serviço de qualidade, universal e a preços justos. Os múltiplos exemplos existentes, não só em Portugal mas também nos mais diversos locais do planeta, demonstram amplamente que este passo, que as Câmaras da Região de Aveiro estão a dar, com a criação destes sistemas e que desembocam invariavelmente na privatização do serviço, resulta sempre num encarecimento brutal dos preços da água e do saneamento. Tem sido assim na Beira Interior, no Minho e também no Alentejo, onde a Câmara de Évora esteve recentemente 3 longos dias sem água devido a uma falha clamorosa da empresa concessionária. Exemplos de total insensibilidade social são igualmente a marca destes sistemas onde impera a lógica mercantil do lucro puro e duro e sempre à custa daqueles que menos ganham. Penalizam-se poços e outras captações domesticas, quando não se obriga pura e simplesmente as pessoas a pagarem a ligação, fecham-se fontanários e lavatórios públicos em uso há décadas. Não é por acaso que muitos municípios estão hoje a ponderar voltar a nacionalizar a água. O exemplo mais emblemático chega-nos de Paris, onde recentemente e depois de uma dura batalha o Câmara rescindiu com o operador privado e optou por nacionalizar novamente o serviço de abastecimento de água.
Na sua intervenção, Miguel Viegas, depois de situar a questão numa perspectiva mais vasta, descrevendo o mercado mundial da água hoje completamente dominado por um punhado de empresas multinacionais gigantescas que exercem uma influência politica determinante nos grandes fóruns mundiais (FMI, Banco Mundial, OCDE, Nações Unidas etc.), descreveu os pormenores deste negocio denunciando a sua completa hipocrisia. Sob uma capa da eficiência do mercado, onde domina a iniciativa privada com os seus modernos métodos de gestão empresarial, o que existe na prática é um chorudo negocio de milhões de retorno garantido à custo do erário público e de todos os consumidores. Uma concessão por 50 anos, feita sem qualquer critério, feita ao abrigo de um contrato de gestão que garante uma remuneração choruda de todos os capitais investidos a uma taxa mínima nunca inferior a 6-7%. A forma hipócrita com que este sistema tem sido apresentado como 100% pública é outra falácia que demonstra ignorância ou má fé por parte da Câmara Municipal de Ovar. São os próprios estatutos que desmentem este carácter pública da parceria quando prevê explicitamente a privatização de 49% do capital. Por outro lado, a lei que rege a parceria (DL90/2009) abre de forma escancarada as portas à entrega a privados de todo o serviço ao advogar a concessão de parte ou da totalidade da rede a privados por parte da Entidade Gestora (neste caso a Águas da Região de Aveiro).
Das várias intervenções do pública destaque-se o contributo do economista Nogueira de Sousa que provou através de uma análise sólida e alicerçada em números irrefutáveis, que este é uma passo totalmente desprovido de qualquer racionalidade económica. Aproveitando o debate, voltou, à semelhança do que tinha feito na última Assembleia Municipal, a desafiar a Câmara a nomear uma comissão independente que avalia esta situação e elabore um estudo com todas as alternativas, em nome da defesa dos interesses do município de Ovar e da sua população.
Encerrando o debate, e antevendo a próxima reunião da Assembleia Municipal de Ovar marcada para os dias 18 e 25 de Março como uma fuga para a frente por parte desta Câmara, Miguel Viegas não deixou de sublinhar que a luta vai continuar, mesmo depois da adesão, pois sendo esta à partida uma parceria 100% pública, estão criadas todas as condições para a sua privatização, pelo que se impõe a mobilização de todos quanto defendem a água como um direito fundamental.