A Câmara Municipal anunciou recentemente a sua intenção de aquisição onerosa de dois imóveis, inacabados e em estado de degradação, um situado no Lugar das Luzes, o outro na Av. D. Maria II, preparando-se para solicitar um empréstimo no valor de 1,7 milhões de euros.

Ao PCP, nomeadamente ao seu deputado municipal, Miguel Jeri, no âmbito da preparação da discussão e votação deste processo pela Assembleia Municipal, foi disponibilizada uma série de documentação que, apesar de extensa, é omissa e pouco esclarecedora, não permitindo que a Assembleia possa tomar uma decisão informada, responsável e criteriosa face aos elevados valores em causa, tendo em conta o nobre fim a que a Câmara alega a que se destinam - habitação social.

Aliás, o facto de a documentação disponibilizada pela Câmara, se revelar omissa e incompleta, bem como pelo facto de não ter sido convocada a Comissão Especializada de Urbanismo da Assembleia Municipal para discussão mais aprofundada, motivou o adiamento da discussão destes pontos na última reunião da Assembleia, de 28 de Junho.

Habitação Social - Uma necessidade do município
A habitação social é uma necessidade há muito reconhecida e defendida pelo PCP e pela CDU, sendo urgente o alargamento parque habitacional do município, conforme o PCP tem vindo sucessivamente a reivindicar quer na sua acção diária, quer nas Assembleias Municipais, quer ainda nas propostas aos Orçamentos e Grandes Opções do Plano.

A habitação social, como toda e qualquer outra competência do Estado, deve ser regida por critérios de boa utilização dos recursos públicos - e foi sobre a adequação e conveniência deste projecto em concreto que foi chamada a Assembleia Municipal a pronunciar-se, em alternativa a quaisquer outros projectos de habitação social que possam existir.

Os contornos do negócio
Trata-se de um negócio envolvendo uma quantidade avultada, de 1,7 milhões de euros, destinada à aquisição de dois prédios inacabados e em estado de degradação, sitos um no lugar das Luzes (por 420.000€) e outro na Av. D. Maria II (por 1.280.000€), sendo o primeiro propriedade da Caixa Geral de Depósitos e o segundo propriedade de um Fundo Imobiliário pertencente também à CGD.

Trata-se de um processo longo, que se pode dividir em várias fases:
- Uma fase inicial, de licenciamento indevido pelo então executivo PS liderado pelo Dr. Armando França, no ano 2001, à margem do regulamento PDM então em vigor, que transitou em julgado tendo sido decretada em 2013 a nulidade do processo de licenciamento.
- Segue-se uma fase mais recente mas que ainda assim já se arrasta desde 2014, data da avaliação inicial do valor dos imóveis com vista à sua aquisição, tendo em Julho de 2016 a CMO iniciado contactos com a CGD com vista à aquisição dos imóveis em causa.

Neste caso em concreto, o PCP destaca desde já os seguintes factos:
- Que o Município foi instado, pela sentença do processo 672-A/2002, ao licenciamento (legalização) do remanescente do edifício das Luzes no prazo de um ano, prazo este que terminaria até ao final de Janeiro de 2019;
- Que apenas em Novembro de 2018 o Sr. Vereador Domingos Silvas despachou pela “avaliação urgente dos custos da requalificação” dos imóveis em causa;
- Que esta “avaliação urgente” estima um investimento de 1,7 milhões de euros aos quais acrescenta, por estimativa, cerca de 804.000€ para reabilitação do edifício sito nas Luzes, e 3.179.000€ para reabilitação do prédio sito na AV. D. Maria II, perfazendo um total de cerca de 5,7 milhões de euros;
- Que a aquisição do prédio das Luzes aparece, na argumentação da Câmara, como uma vantagem face ao não pagamento de uma indemnização pela eventual demolição do prédio, mas omitindo em toda a extensa documentação o valor dessa indemnização;
- Que a CGD condicionou desde logo as negociações da aquisição do prédio das Luzes à aquisição forçada do prédio na Av. D. Maria II, não aceitando a venda isolada deste primeiro imóvel, condições que a Câmara aceitou aparentemente sem contestar;
- Que o valor proposto em 1 de Julho de 2016 à CGD foi de 1,7 milhões de euros, sendo que durante estes 3 anos os prédios apresentaram evidentemente uma deterioriação subsequente, sendo a Câmara incapaz de rever em baixa este valor, mantendo a sua proposta de 1,7 milhões;
- Que foram facultados os relatórios da avaliação dos imóveis por um perito mas que esses relatórios salientam que está fora do respectivo escopo a “avaliação da qualidade estrutural bem como do estado de conservação dos edifícios”
- Que não foram facultados os relatórios relativamente à estimativa de cerca de 4 milhões de euros que a Câmara pretende gastar na reabilitação dos edifícios;

Todas estas situações carecem de esclarecimento, merecendo este assunto, no nosso entender, uma discussão mais atempada, uma discussão mais informada dos valores a gastar no presente e no futuro, do retorno social dos investimentos tendo em conta que se trata de um investimento cuja previsão, fora as derrapagens orçamentais, ascende já a 5,7 milhões de euros.

Perante isto, o deputado municipal do PCP enviou já um requerimento à Câmara Municipal, solicitando os seguintes esclarecimentos por escrito:

1. Quantos fogos pensa a Câmara construir nos edifícios em causa e, em suma, qual o retorno social para as famílias mais carenciadas?
2. Explorou a Câmara outras opções para dar resposta às carências do parque habitacional, nomeadamente construção, aquisição ou reabilitação de outros imóveis?
3. Qual o valor da indemnização a pagar à CGD em caso de demolição do prédio sito no lugar das Luzes, valor esse que a Câmara nunca referiu na documentação enviada?
4. Que dados nos pode apresentar sobre os estudos sobre a estimativa dos custos de reabilitação, e porque razão este processo apenas teve início em Dezembro de 2018?
5. Tendo em conta o hiato temporal de 3 anos face à proposta enviada à CGD em 2016, porque razão não reviu a CMO, em baixa, o valor de 1,7 milhões proposto em 2016?
6. Por que razão o relatório de avaliação dos edifícios deixou de fora a “avaliação da qualidade estrutural e do estado de conservação dos edifícios”, quando é público o avançado estado de degradação especialmente daquele sito na Av. D. Maria II, sendo precisamente este estado de degradação que motiva o grande interesse da CGD à sua alienação, a ponto de condicionar a venda do prédio sito nas Luzes à aquisição “forçada” do outro prédio?
7. Que soluções tem a Câmara para os casos sociais que têm habitado as ruínas destes prédios, e que estratégias tem para a sua reinserção social?
Sem mais de momento, despeço-me apresentando cordiais cumprimentos.

O PCP continuar-se-á a bater pelo alargamento do Parque Habitacional do município sob os princípios da solidariedade social e da boa utilização dos recursos públicos. Exige-se uma estratégia de habitação social clara, bem delineada, transparente e sobretudo participada, que providencie habitação digna, de boa qualidade e a preços acessíveis para os munícipes mais carenciados.

Ovar, 8 de Julho de 2019
A Comissão Concelhia de Ovar do PCP

 

Em anexo: 

Requerimento apresentado pelo deputado municipal Miguel Jeri, sob o título

Aquisição de Imóveis no Lugar das Luzes e na Av. D. Maria II